O MAL DELE É A FALTA DE LEMBRANÇAS!

O MAL DELE É A FALTA DE LEMBRANÇAS!

Meu amigo anda esquecendo a sua história. A “cabeça”, costuma dizer, está morrendo. Essa “cabeça” dele, trocando em miúdos, são as células cerebrais. Está mal. Com o Mal de Alzheimer. Esse  mal descoberto por Alois Alzheimer.

Pouco a pouca ele começa a não saber o que veio fazer aqui e por que por aqui ainda mora. Nem preocupado  também está com o dia da partida. Esse ele nunca soube. Ninguém. No dia em que trocar de roupa e for morar noutra cidade não levará consigo lembranças do que viveu e sofreu por aqui. Nunca foi um sofredor. Mas não levará essa lembrança com ele.

Pouco a pouco ele vai esquecendo que um dia foi feliz e sempre soube que feliz nesse dia  fora. Nada do quase aforismo “fui feliz e não sabia”. Ele antes lembrava o seu passado como se ele nunca deixara de estar presente. Nomes de rua e números de casa. Amigos e os poucos inimigos que ficaram no caminho de sua lembrança.

As histórias dos amigos não são contadas mais nos detalhes que ele fazia questão de nos chamar a atenção para os mesmos. E algumas lembranças dos pais começam a ficar distantes. Histórias que ele contava e sorria antes mesmo do sorriso de quem as ouvia hoje são pedaços de lembranças.

Não raras vezes toma o café da manhã e no almoço esquece o café tomado. O encontro não raras vezes distantes. Mas uma distância que pode ser definida como “lugar algum”. Ele não voa mais com o pensamento. Nem pensa. E voar era o que mais saiba fazer. Tinha uma imaginação alada. Estava sempre lugar da história que contava. Agora com as lembranças saindo pelas janelas da memória só lhe resta conformar-se com o esquecimento.

Ele fala com os irmãos como se esses fossem outros. Confunde-os. Os nomes deles são trocados naturalmente. Assim como quem chama manga de abacate ou abacaxi de banana. As frutas, porém,  são as mesmas e a mudança de nomes nãos lhes tira o gosto. Passa horas falando com uma pessoa, mas achando ser outra a pessoa com que fala.

E as músicas? Nenhuma nova aprendeu. E as velhas canções que cantarolava desafinado já não tocam mais na agulha do seu olho que pouco ou quase nada mais enxerga. Não ler amais. Não assiste a filmes. Não ouve músicas. Esses não dizem mais nada para ele.

Embora não fosse bom leitor nem gostasse tanto assim de assistir a filmes agora optou mesmo por um “the and” com trânsito em julgado. Nada mais. A memória não guarda a própria memória. Um dia tudo estará consumado. Toda a memória apagada. Será um homem sem lembranças.  Apenas uma lembrança do que fora para os poucos que se lembram dele.

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