O meu Maestro brasileiro EDINO KRIEGER não mora mais aqui

O meu Maestro brasileiro EDINO KRIEGER não mora mais aqui

O maestro Edino Krieger passou por aqui

por Humberto de Almeida*

Ele nasceu em Brusque (Santa Catarina), no dia 17 de março de 1928. Estão fazendo as contas? Pois é. Edino Krieger, esse mesmo que pede que “por favor” não o chame de “Édino”, com esse “E” maiúsculo acentuado, um dos maiores compositores em atividade do mundo, que nesse dia, 17 de março, estará fazendo exatamente 89 anos de vida e muita música. Pois é. O Maestro passou por aqui.

Por acaso – o convite veio em forma de Rosa – também fui convidado para o mesmo aniversário em que o Maestro convidado também fora. Um encontro festivo e familiar. Ou vice e versos. Nesse dia, muito bem acompanhado, recebi do Maestro Edino uma alegre e divertida aula sobre a vida e a música. Tudo sem esquecer a minha bela e gostosa música nordestina, essa que para o Maestro é uma das mais ricas do mundo.

– Ah, 1berto! Eu gosto muito da música de vocês! Admiro muito o Repente. As Emboladas e Cantadores de viola. Maravilhosos! As imagens poéticas que eles conseguem criar são maravilhosas! Tem mais: métricas perfeitas e versos redondos!

O Maestro ainda contou boas histórias sobre os nossos Eleazar de Carvalho (Iguatu – CE) e José Siqueira (Conceição-PB). Sobre o primeiro, lembrou as “peças” pregadas por alunos e regidos. “Eleazar tinha uma memória fenomenal! Bastava uma leitura da peça e… estava tudo na cabeça!”. José Siqueira? “Ah, esse teve uma importância histórica na valorização do músico brasileiro! Não era muito de composição. Mas, nesse campo, – valorização – os músicos devem muito a ele”.

O papo com Edino, aos 89 anos ou quase isso, considerando que na próxima semana a essa idade chegará, graças a Deus, mesmo com toda a erudição musical que o mundo conhece, respeita e admira não tem nada de professoral. É todo sorriso à flor da pele. E se não bastasse, livre gargalhada espalhada entre uma história e outra.

E a do filho Edu, versado nos “mistérios existenciais” ou coisa parecida, que lhe perguntou no dia em que fazia 68 anos, sabendo que nessa idade ele perdera o pai, se não entrava em crise pelo fato de estar fazendo exatamente a idade em que o seu “mestre da banda” trocou de roupa e se mudou para outra cidade?

– Não tenho a idade do meu pai, seu avô, como parâmetro. Mas a da minha mãe, sua avó, que viveu por aqui quase 100 anos!

Edino é assim. Nada de professoral nas conversas. Sempre o mesmo. Estando em festa de aniversário ou depois de uma de suas muitas apresentações por aqui e alhures. Nunca destoa. Assim, por mais que insistam em dizer que de perto ninguém é normal, o maestro Edino Krieger é normalíssimo. Não existe entre ele e o mais leigo dos fãs aquele que se sinta constrangido numa aproximação.

Se essa sua rara qualidade por si não bastasse, simplicidade a toda prova, coisa mesmo de gênio, pessoa capaz de contar uma piada e sorrir com a piada contada como se estivesse contando a referida pela primeira vez, tem ao seu lado a companheira de mais de 40 anos, Neném, por todos assim chamada carinhosamente, que é somente sorriso e alegria. Um fato, esse perceptivo por todos, que a torna dezenas de anos mais jovem.

Mas nada melhor que ouvir esse mestre sem nenhuma pretensão de ser engraçado. Edino não precisa.  O seu humor é tão natural quanto o seu “Canticum naturale” (1972), composto em “parceria” com os pássaros, esse fazendo coro, e os sussurros da Amazônia.

Sem aquele chato ar a professoral, repito, o maestro discorreu sobre a sua terra e família e contou histórias que mereciam ser encerradas em um “capa dura”. Um homem de mil histórias vividas e merecedoras de um livro somente para elas.

Ali, nesse dia, sábado passado, num papo entre sorrisos e suaves doses de uísque não se encontrava o crítico de música e colunista do Jornal do Brasil (caderno B) e Tribuna da Imprensa. Mas o menino que contava – sem mesmo que fosse perguntando – sobre o porquê do seu “estranho nome”. “O Edino foi uma homenagem do meu pai a um colega de farda”.

Em Brusque, cidade natal, não havia o que chamamos por aqui de Quartel ou departamento outro parecido. Era “Tiro de Guerra”. Uma instituição militar do Exército Brasileiro, encarregada de formar atiradores e/ou cabos de segunda categoria (reservistas) para o exército. Vocês sabem. Assim, o seu pai, Aldo Krieger, foi enviado para servir (de verdade) em outra cidade. E saindo dela já como “maestro” de banda de música da cidade.

Assim, por lá, graças a um superior hierárquico, o musico foi descoberto enquanto executava serviços gerais no quartel onde servia. Resultado: em pouco tempo era quase o “dono” da banda. Pois bem. Foi lá que conheceu o “Edino”, nome esse que mais tarde em homenagem ao mesmo, batizou o seu musical filho.

O papo com Edino não tem nada daquele ar professoral nem clima de erudição. Ele não posa de “professor”. Mestre? Nem pensar. Nenhuma importância se não encontra no meio um ouvinte no mesmo nível do papeador. Suas histórias são todas contadas com o humor típico de quem estar de bem com a vida.  Sempre. Todas assimiladas por todos, e0m atos rápidos e engraçados.

Nessas historias são muitos os personagens famosos que merecíamos conhecer. Não digo gozar da amizade que esses tinham – muitos tem ainda – com o maestro. São muitos. Paulo Moura, para quem escreveu/transcreveu obras para o seu sax alto, (brasiliana?) e ele gostou tanto que “fugiu” com a partitura. Vinicius de Moraes, o poetinha de quem ainda guarda boas histórias, parceirinho seu na instigante “Fuga e antifuga, quarto lugar no Festival Internacional da Canção, do ano de 1967. Maestro Hans-Joachim Koellreutter, Claudio Santoro, Guerra-Peixe e Eunice Catunda, esse que formavam o Grupo Música Viva… Mas falar sobre o compositor, o crítico musical e o produtor cultural é correr risco de ficar pelo caminho sem mostrar toda a “genialidade” do virtuose menino que iniciou estudos de violino aos sete anos com seu pai, realizando recitais no Estado dos nove aos 14 anos.

Depois do papo com esse “jovem” de 89 anos, isso mesmo, lucidez em cada frase e marcando essa com um humor típico de quem estar sempre de bem com a vida, não se leva a impressão de que ali estava um dos mais importantes compositores eruditos do mundo em atividade. Mas aquele colega que acabou de contar mais piada sobre o amigo Vinicius de Moraes. Esse mesmo que lamentava o fato de ser grande poeta, mas pequeno no essencial que tanto desejava: “Se houver reencarnação, acreditem, desejaria voltar como Vinicius mesmo. Só uma coisa: quero voltar com o pau um pouquinho maior”. E encerra a história numa gargalhada incontida.

Esse sem dúvida é o maestro Edino Krieger, um exemplo acabado da simplicidade que faz dos mestres e/ou gênios merecedor de todo o nosso respeito e admiração. Edino é esse exemplo acabado.

A minha benção, maestro!

SOBRE O AUTOR

Humberto de Almeida

Humberto de Almeida

Jornalista e escritor paraibano. Somente um pouquinho mais tarde viria o 1berto de Almeida – nasceu, cresceu, viveu e, mesmo não morando mais em Jaguaribe, nele ainda vive.

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