Eu plural: confesso que ainda pensei em deixar algumas mal-traçadas aí ao lado sobre essa bela e inesquecível lembrança do poeta em estátua. mas por mais que eu dissesse, considerando que quase sempre diante de algumas situações não consigo dizer nada, diria muito pouco.
lembro apenas dizer um dia que um dia ao lado desse poeta em estátua estaria. nada mais. não iria perturbar-lhe o silêncio. apenas com ele dividir o meu silêncio. isto, claro, se assim, em silêncio, ele mo permitisse.
ah, na famosa calçada de copacabana. estaria um dia ali. posto seis. apostava até. assim para os meus botões hoje mais carne do que osso, sedentos de poesia, e estive.
lembro dia e hora. lembro tudo. mas achei – depois de todo esse nariz de cera – que o seu “sentimento do mundo” diria tudo que nesse momento – nem em outro – eu não conseguiria. nunca.
portanto, hoje, 120 anos de nascimento desse poeta-midas que em tudo que falava ou escrevia virava poesia, em sua homenagem, espalhe-se a poesia pelo ar!
fala, poeta!
1berto de almeida.
SENTIMENTO DO MUNDO
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio de escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desjeo, morto
o pântano sem acordes.
Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso, anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desafiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microscopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer
esse amanhecer
mais que a noite.