Ah, fui buscar na boa e hoje indispensável internet para melhor contar essa história para vocês. Tudo aconteceu em consequência de uma leitura que fiz de uma crônica do muito bom Bráulio Tavares. A arte de cruzar palavras. É o título. A crônica foi publicada no velho e bom Jornal l da Paraíba (Campina Grande), no dia 23 se setembro de 2005! Faz tempo, não? Faz. Mas deixa eu contar melhor a história, pegando a excelente deixa do poeta-improvisador. O resto vocês entenderão muito bem. Tem mais: o improviso que segue aí deste MB, foi feito exatamente no dia em que a crônica da Bráulio foi publicada!
“Estou sentado no aeroporto, dois caras estão parados à minha frente. Um deles olha o relógio e comenta, com ironia: “são duas horas de espera… e uma hora no avião”. Pronto: não precisa mais do que isto, o motorzinho começa a trabalhar. Como o leitor talvez saiba, o mote são dois versos de 7 sílabas com os quais devemos finalizar uma estrofe de dez versos. Temos que ir falando alguma coisa cujo desfecho se encaixe com estas duas frases. O esquema de rimas dessa estrofe é AB-BA-AC-CD-DC, ou seja há quatro rimas (ABCD) que se distribuem nestas posições. Como o mote ocupa as linhas finais, suas rimas (DC) estarão presentes nas três linhas mais acima; o resto a gente improvisa.
Eu sempre começo a glosar com rimas pouco trabalhosas, então vou dizendo: “Que troço mais cansativo, esperar no aeroporto!” Estas rimas são aquelas letrinhas “AB” do esquema, e as próximas precisam vir invertidas, “BA”, portanto digo: “eu aqui já quase morto, ou mais morto do que vivo! ”. Muito bem. Agora preciso das duas rimas do meio, AC. Já sabemos que o “A” é “…ivo”, e que o C é “…ão” (para rimar com a última linha, “avião”). Lá vou eu: “Ninguém me dá um motivo, nem me traz explicação”. Dá pro gasto, e vamos em frente, porque bastam mais duas, as rimas “CD”, que devem ser as mesmas rimas do mote, só que invertidas. Remexo no juízo e encontro isto: “Bora lá, tripulação… antes que eu vire uma fera!”. E finaliza-se repetindo o mote: “São duas horas de espera, e uma hora de avião” – Bráulio Tavares
SÃO DUAS HORAS DE ESPERA, E UMA HORA DE AVIÃO
(Sobre ou mote do Bráulio Tavares)
Que troço mais cansativo, esperar no aeroporto
Eu aqui já quase morto, ou mais morto do que vivo
Ninguém me dá um motivo, nem me traz explicação
Bora lá, tripulação, antes que eu vire uma fera!
São duas hors de espera, e uma hora de avião
Vou cansando ainda mais, com o barulho do motor
Esqueço até pra onde vou, nem o que vou mais fazer
Se fico vão me dizer, “não precisa vir mais não! ”
Sei que saí no verão, e vou chegar na primavera
São duas horas de espera, e uma hora de avião
Imagino estar voando, encontrar o céu dos meus
Tenho pena dos ateus, que não sabem o que é isso
Esses não têm compromisso, nem por isso tem razão
Não sabem da amolação, estão fora dessa esfera
São duas horas de espera, e uma hora de avião
Só quem um dia partiu, com hora para chegar
Sabe o que é esperar, esperar passar o tempo
Não existe passatempo, não existe tempo não
É só prestar atenção, pois nada disso é quimera
São duas horas de espera, e uma hora de avião
O tempo não passa nunca, a gente fica sem ar
É só querer viajar, chegar pra nova partida
Pisar na terra batida, jogar poeira no chão
Dizer “calma, coração! ”, ver la se você manera
São duas horas de espera, e uma hora de avião!
Em tempo meu: não segui a regra. Improvisei como me pedia a cabeça e o ritmo. Fiz mais: tudo assim como se estivesse num desafio com o mais rápido dos improvisadores. As palavras vinham e… a rima pedia passagem! Repito: a regra foi a minha. As regras. Só que não consegui sair do ritmo para as regras adentrar (upa!). Mas gostei, confesso.