Ricardão agora está em processo de adaptação à nova cidade…

Ricardão agora está em processo de adaptação à nova cidade…

Ele é (era) advogado. O seu escritório era – passado, passado – no Ponto de Cem Réis, no centro da capital parahybana. Não pensem que falo do centro e que nesse ele tinha um “escritório”. Não. Era ali mesmo. O seu escritório que tinha cadeiras e máquina de escrever – não me lembro da existência de computador, apenas de algumas máquinas de escrever – era apenas um lugar para repouso.

Foram inúmeras às vezes em que o encontrei contando para outros colegas, mais uma defesa que fez de um cliente que julgava inocente. Era um ótimo profissional. Foram muitas as defesas feitas apenas pelo prazer de um inocente – esse julgado por ele – defender. Ele gostava e muito de atuar nesse campo. Assistiu a muitos filmes de policias e bandidos, e se empolgou com os advogados que nesses atuavam. Nem sei se assistiu a Doze homens e uma sentença.

Agora nem se defender ele pode. Prostrado no leito velho que mal cabe o seu corpanzil – um metro e oitenta, por aí -,  espera a morte chegar. Espera não. Há pouco soube que nem sabe mais o que está fazendo nesta cidade. A roupa que usa não tem mais nem um valor. Essa que deixará por aqui, e servirá de comida para os vermes.t

Estas mal-traçadas saíram ainda quando Ricardão – sempre o chamei assim – morava por aqui.  Tinha mais. No entanto, depois de saber em detalhes as circunstâncias de sua mudança, achei por bem suprimi-las. Ele não gostaria que eu entrasse nos detalhes que, descuidado, deixando os dedos malabaristas por conta própria, espalhei um dia  na tela em branco.

Somente hoje, manhã cedinho, soube que o amigo Ricardão trocou de roupa e se mudou ara outra cidade. Parei. Lembrei de imediato que um amigo em comum, Francisco, bom advogado e ótimo cidadão, pediu-me para não fazer uma visita ao amigo nos seus estertores. Não vá, aconselhou, Ricardo, o nosso amigo, não mora mais aqui.

Foi claro e incisivo. Não o desobedeci. Segui o seu conselho. Ricardão, assim, continuará como aquele bom sujeito contador de boas histórias e amigo dos amigos.

Requiescat in pace, Ricardão!  

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