No princípio, era quase nada: sabia-se as horas e alguns números de telefone, um samba de Ary Barroso e quando terminariam as aulas. Quase nada. Mas a pressão interna aumentou na medida em que fomos mártires do cotidiano. E, em breve, havia mais temas nas conversas noturnas.
Soubemos quem era o responsável pela desgraça do país. E quem se aventurava a uma postura messiânica. Começamos a nos interessar por poesia e pela biografia dos “santos”. Iniciamos correspondência com algumas autoridades (as que aceitaram o jogo…).
Já não era como no princípio: sabia-se as horas e, também, que o mundo não se divide entre mocinhos e bandidos. O mundo se divide em 7,6 bilhões de mundanos. Descobrimos. Isto descobrimos.
E fomos acumulando conhecimento: embaixo das camas, na gaveta das camisas, no bolsinho das moedas. Começamos a brilhar, uns para os outros, como as estrelas de cinema. E trocamos nossos nomes profanos por outros mais respeitáveis.
E fomos acumulando conhecimento. Havia carregadores de informações, como no cais do porto, e um grande estômago para tudo digerir. Havia grandes ventiladores pendurados no teto, apenas para distrair os nossos suores. Havia quem se penalizasse. Quem chamasse os Bombeiros. Quem chamasse a polícia. Quem chamasse o ladrão. Quem chamasse o hospício….
Mas fomos acumulando conhecimento, e tanto e sempre e com tal zelo, que cada gota era um oceano e cada centímetro uma volta ao mundo. E, então, a bem da humanidade poder dormir o seu sono ignorante, tivemos de ser destruídos.
Tivemos de ser destruídos…
Tivemos de ser destruídos!